Olha
Que coisa mais linda
Mais cheia de graça
É ela menina
Que vem e que passa
Num doce balanço
A caminho do mar
Moça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado
É mais que um poema
É a coisa mais linda
Que eu já vi passar

Vinícius de Moraes – Garota de Ipanema

Certamente, você já ouviu esse começo de música por aí, seja em versão nacional ou internacional e talvez até associe essa letra ao gênero Bossa Nova.

O que significa Bossa Nova?

Para responder a essa pergunta, podemos começar mostrando como surgiu a bossa nova. A bossa nova não é fossa, não é jazz, mas também não é samba. Esse gênero musical surgiu como uma nova maneira de tocar o até então famigerado samba carioca urbano e foi um ritmo consagrado pela classe média e intelectual da Zona Sul do Rio de Janeiro, no final dos anos 50 e início dos anos 60.

Isso mesmo, ela, diferentemente, do samba canção da época, era um novo ritmo onde esses jovens da classe média carioca queriam se expressar, pois eles não se sentiam representados pela música que tocava nas rádios ou pelas várias vertentes do samba conhecidas na época.

É por isso que muito da musicalidade da Bossa Nova é uma transgressão em relação ao estilo da música brasileira de até então. Os jovens cariocas da Zona Sul eram uma resposta aos artistas que valorizavam aquele vozeirão e aos temas pesados da dor de cotovelo e da ‘fossa’ cantada no samba canção.

Na década de 50, havia várias reuniões da classe média do Rio de Janeiro em plena Copacabana e o apartamento de Nara Leão, na famosa Avenida Atlântica, 2856 tornou-se o reduto desses compositores e, por assim dizer, foi onde surgiu a Bossa Nova.

O que significa Bossa Nova?

Era ali onde eles começaram a dar a luz às primeiras músicas do estilo e onde aqueles jovens não mais se reuniram para ouvir coisas diferentes, mas para fazer a sua própria diferença.

Vários amigos se juntavam para apreciar músicas diversas e compor as suas próprias. Aos poucos, suas canções e harmonias saíram daquele Apartamento e a Bossa Nova foi em direção às universidades, ganhando um público fiel nos bares de Copacabana e, mais precisamente, no célebre Beco das Garrafas, que se encontra entre os números 21 e 37 da Rua Duvivier, no Rio de Janeiro.

O estilo Bossa Nova foi criado então por esses jovens. Mas a pergunta ainda permanece:

Quem criou a bossa nova?

Dentre os principais compositores que se reuniam nesse Apartamento e depois no Beco das Garrafas estão: Billy Blanco, Carlos Lyra, Roberto Menescal e Sérgio Ricardo. Mas o grupo foi aumentando cada vez mais, e, aos poucos, tinham também Chico Feitosa, João Gilberto, Luiz Carlos Vinhas, Ronaldo Bôscoli dentre outros.

Quem criou a bossa nova

Até que o movimento se consolidou e tínhamos o trio clássico: Tom Jobim era o erudito e fazia harmonias complexas parecerem simples. Vinícius de Moraes era o poeta e o diplomata que ajudava seu parceiro a compor algo mais leve e risonho. João Gilberto contrastava o vozeirão e colocava nas canções algo mais suave com seu violão.

Mas você deve está pensando, como, aliás, é preconceito de muitos brasileiros, que a Bossa Nova é algo maçante e elitista demais, mas ela tinha também os seus protestos. E, podemos dizer assim, a Bossa já foi Nova.

O fato é que na sua transgressão de estilo, ela misturou samba e jazz. O samba já desenvolvido na época ganhou um ritmo mais dinâmico, leve e jovial. E, além disso, esses jovens da Zona Sul trouxeram outra forma de cantar e que é uma marca da MPB até hoje em dia. Todo esse novo estilo já está presente em Chega de Saudade de João Gilberto de 1959:

Não há paz, não há beleza, é só tristeza
E a melancolia que não sai de mim
Não sai de mim, não sai
Mas se ela voltar, se ela voltar
Que coisa linda, que coisa louca
Pois há menos peixinhos a nadar no mar
>Do que os beijinhos que eu darei na sua boca

João Gilberto – Chega de Saudade

Nessa música está presente essa nova forma de cantar que traz a intimidade e a oralidade, deixando de lado o volume, o vozeirão e a erudição das músicas de até então.

No ano de 1958 foi quando surgiu a bossa nova. Aquilo que era apenas uma nova sessão de samba com jazz, anunciado para ser apenas uma apresentação no Colégio Israelita Brasileiro, foi o que tornou o movimento famoso.

Conta-se que uma secretária anotou no quadro negro que haveria uma Samba Session da turma Bossa-Nova e, aos poucos, esse grupo ficou conhecido como um grupo que faz novo samba, ou que faz um “samba bossa nova”, apresentando um samba moderno e cantado de forma diferente. A Bossa Nova era um novo estilo que também contava com um contraste diferencial. A voz dos cantores era baixinha, as temáticas eram leves e possuíam uma narrativa musical falada. Algo totalmente novo na época.

É por isso que a Bossa Nova está associada à construção da nova capital do Brasil em Brasília e à presidência de Juscelino Kubitschek. Bossa nova e JK tem uma relação estética e musical: durante o governo de Juscelino Kubitschek o contraste entre o novo e o moderno ganharam caráter cultural. Juca Chaves foi um dos responsáveis por trazer essa estética à música, homenageando o então presidente e o apelidando de Presidente Bossa Nova, indicando JK como simpático, risonho e original.

Por que bossa nova tem esse nome?

A palavra bossa vem do samba “São Coisas Nossas” de Noel Rosa e passou a ser utilizada no samba de breque e suas paradas súbitas de improvisação. Outro tipo de samba que influencia a Bossa Nova é o samba sincopado ou samba do telecoteco que enfatiza o ziguezague na harmonia e o bom humor.

Queria ser pandeiro
Pra sentir o dia inteiro
A tua mão na minha pele a batucar
Saudade do violão e da palhoça
Coisa nossa, coisa nossa
O samba, a prontidão
E outras bossas,
São nossas coisas,
São coisas nossas!

São Coisas Nossas – Noel Rosa

A Bossa Nova tem uma diferença enorme entre como era antes e como é hoje. Ela surgiu com uma transgressão ao samba e à música brasileira de sua época. De início era apenas um modo de tocar e cantar samba, mas, com o tempo, ela se tornou o movimento mais influente da Música Popular Brasileira.

Alguns pensam que a bossa nova acabou, mas ela é um verdadeiro ponto de fusão e início de uma nova época da música brasileira.

É por isso que não podemos desvincular Bossa Nova e protesto musical.

O começo da década de 60 era a época do pós-guerra e havia muitas polarizações no Brasil, pelo comunismo ou pelo capitalismo, com a Guerra Fria. O Brasil viveu um momento conturbado de implantação de um regime autoritário para decidir os rumos políticos. Até que em 1964 se instaura o regime militar.

Então a relação entre Bossa nova e ditadura militar leva alguns artistas, que já tinham se inspirado na Bossa Nova, a colocarem no ritmo letras levando em conta as causas sociais e as manifestações por um país mais livre.

Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando

Pra Não Dizer Que Não Falei Das Flores: Geraldo Vandré

Alguns desses artistas ficaram bastante conhecidos na época como Geraldo Vandré, Carlos Lyra, Edu Lobo e Nara Leão. Eles compunham letras com tom de manifestação popular e música folclórica. Não só na música, mas as trilhas sonoras para o teatro e para o cinema tinham também esse tom de manifesto.

É em 1967, em plena ditadura militar, que a música popular é veiculada pelos grandes festivais organizados pela TV Record.

Quase não consigo
Na entrada chegar
Pois a multidão
Estava de amargar
Hey! Hey! (Hey! Hey!)
Que onda!
Que festa de arromba!…

Erasmo Carlos – Festa de Arromba

É aí que surge um embate entre Bossa Nova e Jovem Guarda. De um lado temos a jovem guarda, influenciada pelo rock britânico e estadunidense, fazendo uma espécie de iê, iê, iê brasileiro, com os nomes de Wanderléa, Erasmo Carlos e Roberto Carlos.

De outro lado, temos algo do tipo Bossa Nova vs MPB. Ali estavam artistas que, em conjunto, formaram a Música Popular Brasileira. Eles eram os primeiro sucessores da Bossa Nova, defendendo uma cultura musical politizada: Geraldo Vandré, Edu Lobo, Elis Regina e Chico Buarque.

Num tempo
Página infeliz da nossa história
Passagem desbotada na memória
Das nossas novas gerações
Dormia
A nossa pátria mãe tão distraída
Sem perceber que era subtraída
Em tenebrosas transações

Chico Buarque – Vai Passar

Mas eis que surge um movimento inovador que nem está de um lado, nem está de outro. Nesse período de Guerra Fria, onde o Brasil tomou partido pelos Estados Unidos, há algumas dicotomias na cultura musical brasileira. Grande parte dos artistas quis resistir ao imperialismo britânico e estadunidense e organizaram passeatas contra a guitarra elétrica, defendendo a nacionalização da cultura brasileira e da MPB.

É contra esse movimento que a Bossa Nova se ramifica no tropicalismo. Ou como alguns dizem, há um embate entre Bossa Nova VS tropicália, ou Bossa nova VS tropicalismo, porque é justamente nesse contexto vibrante de polarizações entre a música genuinamente brasileira de um lado e a importação das músicas imperialistas de outro, que surgem outros artistas ainda mais transgressores.

Eles propõem a junção de ambos os lados, tanto os conservadores da Música Popular Brasileira quanto a Guitarra Elétrica são instrumentos importantes para as suas composições.

Eu organizo o movimento
Eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento
No planalto central do país
Viva a Bossa, sa, sa
Viva a Palhoça, ça, ça, ça, ça
Viva a Bossa, sa, sa
Viva a Palhoça, ça, ça, ça, ça
O monumento
É de papel crepom e prata
Os olhos verdes da mulata
A cabeleira esconde
Atrás da verde mata
O luar do sertão

Caetano Veloso – Tropicália

Aqui está o início da Tropicália. Em 1967, Caetano Veloso e Gilberto Gil se apresentam no Festival da Canção com a famosa canção “Alegria, Alegria” e “Domingo no Parque”, acompanhado de algo típico da MPB e da música de protesto, mas com fortes marcas da tão amaldiçoada guitarra elétrica.

Caminhando contra o vento
Sem lenço e sem documento
No sol de quase dezembro
Eu vou
O sol se reparte em crimes
Espaçonaves, guerrilhas
Em cardinales bonitas
Eu vou

Caetano Veloso – Alegria Alegria

Esse festival de TV e música marcam o início da Tropicália e uma verdadeira transgressão baiana, trazendo a música brasileira genuína, com temática, ritmo e letra, porém com muita guitarra elétrica.

Os próprios tropicalistas passaram a anunciar que as suas influências não eram os Sargent Pepper’s dos Beatles, mas João Gilberto. O que deixava a ala conservadora da música brasileira de cabelo em pé.

O rei da brincadeira
Ê, José!
O rei da confusão
Ê, João!
Um trabalhava na feira
Ê, José!
Outro na construção
Ê, João!…

Gilberto Gil – Domingo no Parque

É interessante esse movimento de consolidação e transgressão de ritmos que é um marco tanto do início quanto do final da Bossa Nova. Se ela veio de um samba cantando de forma diferente, ela deu origem a vários outros ritmos. Isso é o que põe a essência da Bossa Nova e a define como uma arte genuinamente brasileira.

É por isso que a bossa nova pode ser considerada patrimônio cultural e em 2018, tivemos os 60 anos de Bossa Nova.

No dia 16 de outubro do ano de 2007, a Bossa Nova foi considerada Patrimônio Cultural Carioca pelo prefeito Cesar Maia. De acordo com esse decreto 28552 a Bossa Nova é internacionalmente reconhecida e uma referência artística mundial. Apesar de uma afirmação controvérsia, para muitos, ao passo que o samba é tipicamente brasileiro, a Bossa Nova é tipicamente carioca.

Bossa nova e seus compositores

Dentre os artistas da Bossa Nova podemos subdividi-los em Compositores, Intérpretes, Trios e Conjuntos.

  • Os Compositores: Tom Jobim, Carlos Lyra, Reinaldo Boscôli, Vinícius de Moraes, Roberto Menescal, Oscar Castro Neves, Luvercy Fiorini, Marcos Valle, Paulo Sérgio, Sérgio Ricardo, Baden Powell, Edu Lobo, Torquato, Francis Hime, Ruy Guerra, Durval Ferreira, além de outros.
  • Os intérpretes: João Gilberto, Sylvia Telles, Maysa, os próprios compositores: Carlos Lyra, Edu Lobo, Sérgio Ricardo e Vinícius. A musa Nara Leão, Alaíde Costa, Claudette Soares, Leny Andrade e Elis Regina. Astrud Gilberto, Lennie Dalle, Agostinho dos Santos e mesmo Frank Sinatra.
  • Os trios: Tamba Trio (Luís Eça, Bebeto e Hélcio Milito); Zimbo Trio (Hamilton Godoy, Rubinho e Luís Chaves); Sambalanço de César Mariano; Bossa Três (Luís Carlos Vinhas, Tião Neto e Edison Machado).
  • Conjuntos: Roberto Menescal, Eumir Deodato, Oscar Castro Neves, Ugo Marotta e outros. Walter Wanderley e João Gilberto. Sérgio Mendes: Bossa Rio. O conjunto de Oscar Castro Neves. Os Cariocas, o Quarteto em Cy e o MPB-4. E Os Gatos de Durval Ferreira.

Bossa Nova para ouvir

Algumas pessoas utilizam o gênero para cerimônias, e buscam algum conjunto que possa tocar Bossa Nova na sua festa ou comemoração. Aliás, não deixa de ser uma boa pedida a Bossa Nova para casamentos.

Vários músicos que colocamos e listamos acima podem e devem ser ouvidos. Destacamos algumas letras que estão relacionadas ao gênero musical:

Bossa nova é ser presidentePresidente Bossa Nova – Juca Chaves

O pato bossa nova” – O Pato – João Gilberto

A cantora Rita Lee, além de cantar “Amor é Bossa Nova” na canção Amor e Sexo, produziu um álbum intitulado Bossa’n Bealtes, onde reúne Bossa Nova e Beatles.

O Álbum Sol de Bossa guarda uma coletânea interessante. Ele é cantada e instrumental e conta com vários artistas pelo mundo.

O Álbum Bossa Nova para Bebês pode ser uma boa pedida para seu bebê.

Sobre o tema, recomendamos o livro Bossa Nova e Outras Bossas com uma coleção fonográfica incrível.


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